3ª Edição da Mostra de Cinema Israelense destaca coexistência e visões de uma sociedade em permanente mobilização

Evento online e gratuito realizado pelo Instituto Brasil-Israel traz filmes inéditos e um espaço especial dedicado ao cineasta David Perlov, brasileiro que revolucionou a arte das telonas no país

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June Zero. Foto: Divulgação.

Entre os dias 21 e 27 de novembro, o Instituto Brasil-Israel (IBI) realiza a 3ª edição da Mostra de Cinema Israelense. O evento, que tem apoio do Sesc e acontece de forma online e gratuita, apresenta ao público filmes com visões de uma sociedade em permanente mobilização. Haverá eventos de abertura e encerramento de forma presencial na cidade de São Paulo.

3ª Mostra de Cinema Israelense. Foto: Divulgação.

Sob a curadoria de Bruno Szlak, as obras escolhidas também servem como importante contribuição da sétima arte para ilustrar a coexistência possível na região, justamente em tempos de conflito.

Na programação da 3ª Mostra de Cinema Israelense, a abertura presencial para convidados acontece no dia 21 de novembro, em São Paulo, com o filme June Zero, inédito no Brasil. Na obra, o diretor Jack Paltrow faz um retrato terno, embora cínico, de Israel: um novo país em uma terra velha, lutando contra as dores crescentes de estabelecer sua presença tanto para a comunidade internacional quanto para seu próprio povo.

Exibido online, o filme Hamenaztchim, de Eliran Peled, será exibido pela primeira vez no Brasil. Trata-se de um musical cativante que acompanha dois casais do Kibutz Netzer Sirani, cujas vidas tomam rumos dramáticos no pós-guerra de 1967. No centro está Neta Agmon, cuja carreira de atriz decola assim que seu marido retorna do conflito, mudado para sempre. Enquanto a estrela de Neta sobe, ela enfrenta uma batalha pessoal em casa, tentando se reconectar com o homem que ela conheceu. Em meio a uma nação em celebração, eles navegam pelas consequências invisíveis da guerra e pelo desafio de manter o amor vivo. A história mistura a luta pessoal com a vibração de um musical, oferecendo uma visão nova e envolvente do impacto da guerra, do preço da fama e do poder do amor.

“Nesse momento em que vivemos uma certa escuridão, temos que recorrer à luz da cultura para nos dar esperanças de dias melhores. Na tradição judaica, quando se realiza algo continuamente, pelo menos por três vezes, isso significa um fortalecimento espiritual. Assim, seguir com a Mostra de Cinema Israelense afirma nossa resiliência e vontade de trilhar esse caminho e mostrar que as manifestações culturais alimentam a nossa alma”, afirma Bruno Szlak, curador da mostra.

O encerramento da III Mostra de Cinema acontecerá de forma presencial no dia 27 de novembro, em São Paulo. Será exibido o documentário “In the same boat”, que conta a história de árabes que arriscaram as próprias vidas para salvar civis no dia 7 de outubro.

Outro destaque do evento é o espaço dedicado ao cineasta David Perlov, brasileiro que revolucionou a arte das telonas em Israel. Serão exibidas algumas de suas obras, como o “Em Jerusalém”, de 1963, considerado um dos filmes mais poéticos já produzidos no país; o “42:6”, uma biografia livre do líder David Ben-Gurion, consagrada figura nacional; e os seis capítulos dos “Diários”, registros pessoais de Perlov que testemunham a realidade de Israel. Diários é considerado uma mistura de filmes caseiros, documentário político e cinema-verité, o que lhe dá todas as características de uma obra única.

Nascido no Rio de Janeiro, em 1930, David Perlov iniciou seu trabalho cinematográfico em 1952, ao se mudar para Paris. Ele trabalhou na Cinemateca Francesa junto do lendário fundador Henri Langlois, uma das figuras mais destacadas no desenvolvimento do cinema francês naquele período. Perlov conheceu cineastas como Roberto Rossellini, Georges Franju e o documentarista Joris Ivens, cujas obras serviram como influências seminais em seu trabalho.

Em 1958, aos 28 anos, Perlov imigrou para Israel com sua esposa, Mira. Ao longo de sua vida, nunca se cansou de relatar o quão difícil era se integrar à sociedade local. Sob certos pontos de vista, ele sempre se via como um forasteiro ali, mas ao mesmo tempo como um residente entusiasta que estava comprometido com o lugar. Essa atitude deriva em grande parte do tratamento que ele recebia por parte do establishment, que muitas vezes colocava obstáculos em seu caminho e, até o fim, não sabia exatamente como lidar com ele. Isso, especialmente após dirigir o filme “42:6”, em 1969, que não agradou o establishment.

Na verdade, é preciso lembrar que desde o filme “Em Jerusalém”, de 1963, que foi premiado em Veneza, o estilo realista e intimista de Perlov não ia ao encontro da então narrativa sionista predominante do período, permeada pelos modelos de filmes de propaganda ao estilo soviético.

Mas, seu trabalho mais importante são os Diários, filmados entre 1973 e 1983 como uma resposta do cineasta brasileiro à falta de incentivo estatal para suas produções. No início, com uma câmera de 16mm, Perlov filma a sua vida e a vida cidade, alternando interiores e exteriores de seu apartamento no 3º andar de um prédio em Tel Aviv. Esta alternância entre público e privado estabeleceria um diálogo entre os momentos da família e o que acontecia em Israel no período.

Em 2003, Perlov faleceu, aos 73 anos, dos quais grande parte com genuína e importante contribuição para o desenvolvimento do cinema israelense.

Serviço

3ª Mostra de Cinema Israelense

De 21 a 27 de novembro de 2024

Online e gratuito
Assista em sescsp.org.br/cinemaemcasa

Mais informações em institutobrasilisrael.org.

PROGRAMAÇÃO 3ª MOSTRA DE CINEMA ISRAELENSE

Filmes inéditos no Brasil

JUNE ZERO*
Dir.: Jack Paltrow | Israel | 2022 | 105 minutos | Ficção

June Zero é um filme americano-israelense de drama que resvala em muitos momentos para a comédia, coescrito e dirigido por Jake Paltrow. É sobre o julgamento de Adolf Eichmann, criminoso de guerra nazista capturado pelo Mossad, julgado e condenado à morte em Israel. O foco principal é o destino do corpo de Eichmann. Estreou no 56º Festival Internacional de Cinema de Karlovy Vary. No cerne da história e da memória, June Zero adota uma abordagem original e ousada ao examinar as consequências do Holocausto. Não há escassez de filmes que considerem o Holocausto ou a fundação de Israel. Mas é raro ver os dois assuntos entrelaçados tão propositalmente como em June Zero. June Zero é um retrato terno, embora às vezes cínico, de um novo país em uma terra velha lutando contra as dores crescentes de estabelecer sua presença tanto para a comunidade internacional quanto para seu próprio povo.

*Exibição presencial em São Paulo.

Hamenaztchim
Dir.: Eliran Peled | Israel | 2023 | 118 minutos | Ficção

Com a vitória de Israel na Guerra de 1967, o musical Victory encontra a realidade israelense neste musical cativante. Ele acompanha dois casais do Kibutz Netzer Sirani, cujas vidas tomam rumos dramáticos no pós-guerra. No centro está Neta Agmon, cuja carreira de atriz decola assim que seu marido retorna da guerra, mudado para sempre. Enquanto a estrela de Neta sobe, ela enfrenta uma batalha pessoal em casa, tentando se reconectar com o homem que ela conheceu. Em meio a uma nação em celebração, eles navegam pelas consequências invisíveis da guerra e pelo desafio de manter o amor vivo. Esta história mistura a luta pessoal com a vibração de um musical, oferecendo uma visão nova e envolvente do impacto da guerra, do preço da fama e do poder do amor.

Victory. Foto: Divulgação.

Cinema Sabaya
Dir.: Orit Fouchs Roten | Israel | 2021 | 95 minutos | Ficção

Drama estrelado por um elenco exclusivamente feminino, incluindo Dana Ivgi, Amal Murkus, Marlene Bejali, Ruthie Landau, Haula Haj-Divsi, Joanna Said, Yulia Tagil, Asil Farhat, Orit Samuel e Liora Levy.  O filme conta a história de um grupo de mulheres árabes e judias que participa num workshop de vídeo num centro comunitário de uma pequena cidade gerido por Rona, uma jovem cineasta de Tel Aviv, que as ensina a documentar as suas vidas. À medida que cada aluno partilha imagens da sua vida doméstica com os outros, as suas crenças e preconceitos são desafiados e as barreiras são derrubadas. O grupo se reúne como mães, filhas, esposas e mulheres que vivem em um mundo projetado para mantê-las separadas, formando um vínculo fortalecedor e duradouro à medida que aprendem mais umas sobre as outras, e sobre si mesmas. Cinema Sabaya apresenta um retrato hábil e sincero da capacidade da arte de unir comunidades díspares, movendo-se sem esforço entre a gravidade de suas conversas e a alegria genuína gerada por este improvável grupo de amigos.

Cinema Sabaya. Foto: Divulgação.

In the same boat*
Dir.: Aleksandra Petrova | Israel | 2024 | 60 minutos | Documentário

 O documentário conta a história de árabes-israelenses que, durante o ataque de 7 de outubro, enfrentaram todos os ricos e salvaram vidas de civis, destacando o espírito de comunidade e coragem.

*Exibição presencial em São Paulo.

Espaço Perlov


Em Jerusalém
Dir.: David Perlov | Israel | 1963 | 33 minutos | Documentário

Considerado por muitos como um dos filmes mais poéticos já produzidos neste país e um marco no cinema documental israelense, “Em Jerusalém” é composto por 10 observações engajadas da cidade, antes de sua unificação. Uri Klein (Haaretz) escreveu: “Quando vi ‘Em Jerusalém’, pela primeira vez, em 1963, eu ainda não estava plenamente consciente da importância do filme em si ou de seu diretor, mas sabia que nunca tinha visto um filme israelense como aquele. Sentia que o cinema israelense estava nascendo bem na minha frente”.

 

42:6
Dir.: David Perlov | Israel | 1969 | 90 minutos | Documentário

O segundo longa-metragem de David Perlov é uma biografia livre de David Ben-Gurion. O filme abrange desde a infância de Ben-Gurion em sua cidade natal, Plonsk, na Polônia, onde testemunhou a visita de Theodor Herzl sendo tratado como um Messias, passando pela Guerra de Independência de 1948, até os últimos anos de Ben-Gurion, no kibutz Sdeh Boker, onde ele aparece em pessoa aos 84 anos. Na época, o filme recebeu críticas severas devido à sua abordagem cinematográfica ousada sobre uma figura nacional consagrada. Perlov, por exemplo, pintou antigos cinejornais em preto e branco com cores brilhantes, e foi repreendido por isso. Em uma entrevista na Rádio do Exército, Perlov respondeu aos seus críticos: “Um Ben-Gurion em preto e branco é mais natural que um vermelho ou azul? E o que dizer do Jesus amarelo de Gauguin, ou do rabino verde de Chagall? O artificial não é uma característica essencial de toda arte?”.

DIÁRIOS
Filmado ao longo de dez anos, “Diários” é um registro político, profissional e pessoal, além de um testemunho da realidade de Israel. Os seis capítulos do filme nos levam de Tel Aviv a Paris, Londres e Brasil, onde Perlov nasceu e decide retornar após vinte anos de ausência. Organizado como um ensaio cinematográfico, Perlov dividiu o trabalho em três capítulos temáticos: “Infância Protegida”, “Rotina e Rituais” e “Volta ao Brasil”.

Capítulo 1: Uma Infância Protegida (2 partes)
Dir.: David Perlov | Israel | 1973-1983 | 165 minutos | Documentário

Um poema cinematográfico à beira de um filme caseiro. David Perlov filma sua família, enfatizando o olhar mútuo entre eles e a câmera, e insinuando o abismo entre a vida descontraída de seus netos e sua própria infância no Brasil.

 

Capítulo 2: Cotidiano e Rituais, (2 partes)
Dir.: David Perlov | Israel | 1973-1983 | 165 minutos | Documentário

Na segunda parte de seu Diário Revisado, a câmera de Perlov o leva do território privado ao público. No centro do filme está o assassinato do Primeiro-Ministro Yitzhak Rabin; mas logo fica claro que o filme transcende a gravação objetiva da atualidade israelense e, em vez disso, a interpreta, quase a recria. O cotidiano e o ritual se entrelaçam e, em alguns momentos, tornam-se um só.

 

Capitulo 3: De Volta ao Brasil (2 partes)
Dir.: David Perlov | Israel | 1973-1983 | 165 minutos | Documentário

Assim como no Diário, o Diário Revisado termina no Brasil. Seu clímax é uma visita hesitante e dolorosa à casa de infância de Perlov na cidade de Belo Horizonte, para a qual ele é atraído como se fosse contra sua vontade. No coração deste capítulo, há uma longa viagem no único bonde restante no Rio de Janeiro: “um bonde chamado cinema, um bonde chamado realidade, um bonde chamado memória” (Uri Klein, Ha’aretz).