Dos dias 14 a 16 de março, o Polo de Turismo Histórico Judaico de Quatro Irmãos e Região promoveu o evento Dia Nacional da Imigração Judaica, na região onde existiu a maior Colônia Judaica de Imigração Oficial no Brasil, chamada na época de Fazenda Quatro Irmãos, e atualmente, com localidades, prédios e histórias presentes, nos municípios de Quatro Irmãos, Erechim, Erebango e Jacutinga. Representando a Federação Israelita do Estado de São Paulo, viajei, na tarde do dia 13, mais precisamente às 17h40min, ao Rio Grande do Sul.
A iniciativa foi organizada pelo Instituto Cultural Marc Chagall e as prefeituras da região, em um modo de perpetuar a memória dessa imigração em massa, ocorrida da Bessarábia e do Império Russo, graças ao projeto filantrópico do Barão e da Baronesa Hirsch, financiadores da ICA/JCA – Jewish Colonization Association, que resgatou milhares de famílias judias da pobreza e perseguição do antigo Império Czarista Russo, e comemorar o Dia Nacional da Imigração Judaica antecipadamente, que seria celebrado no dia 18.
A rota, itinerante e que reuniu pessoas vindas de Porto Alegre, São Paulo, Israel, Rio de Janeiro e Paraná, começou, à tarde, a partir das 14h30, na Sociedade Cultural e Beneficente Israelita de Erechim, onde se podia visitar uma interessante exposição acerca da história do Hospital Israelita Leonardo Cohen da Antiga Colônia Judaica de Quatro Irmãos e marcar presença nos lançamentos dos livros “Shtetele – Os Judeus do Sul”, do fotógrafo e documentarista da História Judaica Felipe Goifman, “Travessias – Aventuras e Desventuras de Famílias Imigrantes”, do jornalista e escritor Fabio Steinberg e “Escritoras Israelenses de A a Z”, coletânea organizada por Leniza Kautz Menda. Conversei com os três escritores no local, que me contaram um pouco da essência de suas obras.
“Eu estava devendo há muito tempo, para mim mesmo, uma história contando sobre os imigrantes. Sou neto e filho de imigrantes e penso que é um dado importantíssimo em nossas vidas, pois só estamos aqui pelos sacrifícios do passado. Comecei a partir do diário de minha mãe e percebi que teria que pesquisar mais para saber mais o que aconteceu dessa gente que veio da Europa no começo do século e que veio para o Brasil com a cara e a coragem sem saber a língua, os costumes, sem saber onde iria morar e sem dinheiro”, disse Fabio.
“Percebi que o público brasileiro não tinha conhecimento das escritoras israelenses. Portanto, eu resolvi ler, a maioria em inglês, obras das mesmas e fazer resenhas as apresentando. Me apaixonei por essas escritoras”, comentou Leniza.
No mesmo dia, às 19h30, foi realizado um Shabat especial no CTG – Centro de Tradições Gaúchas, reunindo aspectos culturais do judaísmo e do gauchismo. A cerimônia, emocionante, foi conduzida pelo Rabino Nilton Bonder.
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O segundo dia foi marcado pela realização da Rota Judaica, do Polo de Turismo Histórico Judaico de Quatro Irmãos e Região, com guias treinados. O passeio, cativante, e que começou cedo, por volta das 8h, teve como primeiro ponto de parada a Estação de Erebango, uma estação de trem criada pelo judeu Franz Philippson, que deteve as concessões ferroviárias do Rio Grande do Sul e Argentina. No local, foram feitas apresentações musicais de talentos do município, que no passado, neste núcleo da Colônia, abrigou famílias como Sirotsky e Birman, e da banda Knaidel, grupo musical klezmer de Erechim, além do coral Zemer, da Naamat Pioneiras de Porto Alegre. Na ocasião, ganhei de presente de Sergio Lerrer, jornalista, cineasta e Secretário do Polo de Turismo Histórico Judaico de Quatro Irmãos e Região, o livro “Memórias da Colônia de Quatro Irmãos”, de Marcos Feldman. Foi um momento de grande alegria para mim, um real reconhecimento de meu trabalho como Assistente de Comunicação da Federação.
O segundo local de visita foi a Escola Municipal de Ensino Fundamental Baronesa Clara, local no qual crianças da colônia judaica e da comunidade frequentavam para o aprendizado e que hoje possui um prédio que necessita de recuperação. Foi lançada na ocasião uma linda campanha para essa reestruturação.
No meio do caminho, o grupo parou para conhecer a Micvê Baronesa Clara.
A próxima parada foi o “Mato do Chia”, espaço de dois lotes do último judeu morador de Quatro Irmãos, que está sendo transformado em um parque, com um segmento chamado de Bosque da Imigração Judaica do Brasil, registrando sobrenomes e famílias, que narram sagas e origens da comunidade judaica de todo o Brasil, de todas as fases da presença judaica no país e da emigração em si. No final da visita, houve o ato de lançamento e primeiro plantio coletivo, em parceria com o KKL Brasil. Foi uma experiência única deixar, através do plantio de uma árvore, minha marca, como representante da Federação, ali.
Após o almoço, o próximo ponto de visita foi o prédio de madeira do pioneiro Hospital Israelita Leonardo Cohen, de 1929, construído por engenheiros ingleses e dirigido por médicos judeus alemães em fuga do nazismo. Ele teve uma arquitetura pioneira de aproveitamento da ventilação, de piso pensado para reduzir infecções, e aproveitamento solar, sendo o primeiro hospital no país de referência em área rural. Na ocasião, médicos judeus de hospitais como Albert Einstein, Sírio Libanês, Moinhos de Vento, Grupo Fleury entre outros, prestaram homenagem à história e ao legado, se engajando na recuperação da edificação.
Eliezer Berenstein, médico ginecologista, aceitou me dar um depoimento e contou que nasceu no hospital em 1952, pelas mãos de Otto Goldberg, o mais longevo Diretor Clínico de lá. “Estou muito emocionado”, disse em relação à ida ao local.
Ainda, houve uma visita à antiga Escola Barão Hirsch, no município de Jacutinga, um colégio comunitário da colônia, que inclusive, inspirou o uniforme do atual Colégio Israelita de Porto Alegre e compatibilizava o português, o iídiche, o russo e o polônes. O momento contou com uma bela apresentação da Banda Municipal de Quatro Irmãos, um projeto social que oferece aulas de música e dança gratuitas para crianças e adolescentes, que interpretam músicas judaicas.
Sergio Napchan, diretor executivo da CONIB – Confederação Israelita do Brasil, me deu um depoimento, ainda na escola, destacando que estava vivendo uma experiência lindíssima. “É uma forma muito bonita de celebrar o Dia Nacional da Imigração Judaica em um local tão importante para a história dos judeus no Brasil. Estou muito feliz de estar aqui pela CONIB, neste grupo, convivendo com as pessoas que residem aqui, alguns descendentes e os moradores das cidades.”
No domingo, o último dia dessa jornada, foi feita uma passagem pelo Cemitério Israelita de Quatro Irmãos, Patrimônio Histórico Municipal, onde foi feito o Kadish dos Enlutados, pelo presidente da Sociedade União Israelita de Passo Fundo Sr Berel Natan Engelman e realização de um depoimento de Taub Faiguenboim, bisneta do colono David Faiguenboim, cuja família foi uma das pioneiras da região.
Após a cerimônia, ocorreu a chamada “Marcha da Tolerância”, cujo objetivo era passar a mensagem de convivência plural entre etnias e religiões, em meio a um mundo polarizado. A caminhada terminou no Hospital Israelita Leonardo Cohen, com primorosas apresentações da banda Knaidel, além do coral Zemer, da Naamat Pioneiras de Porto Alegre, Banda Municipal de Quatro Irmãos e do Grupo de Dança Folclórica Italiana de Erechim.
Ainda, na ocasião, houve, em parceria entre o Polo de Turismo Histórico Judaico de Quatro Irmãos e Região e a CONIB, a entrega, em primeira edição, do Prêmio Tolerância, em homenagem às cidades que receberam imigração judaica no passado mas que, em cenário mais amplo, receberam várias imigrações em fuga da pobreza e da intolerância na Europa. Foram destacados e lembrados os municípios de Quatro Irmãos, Jacutinga, Erebango, Erechim, Passo Fundo e Itaara, onde está a fazenda da primeira colônia judaica no país, de Philippson. A entrega foi realizada por Sergio Napchan, para Prefeitos e Presidentes de Câmaras Municipais.
“É um passeio que visa resgatar a memória, o afeto, as reminiscências da imigração judaica no Brasil, o papel dela na formação do país e do povo brasileiro e passar essa mensagem de maneira emocional para todos que vêm para que não percam aquilo que lhes move, para a sociedade geral e pelo judaísmo. Nossa capacidade de contribuição, mantendo os laços com o passado que nos levam ao futuro”, pontuou Sergio Lerrer.

Beatriz Novik Falcão é jornalista formada pela FAAP em 2023. Ainda na faculdade, produziu conteúdo para mídias sociais no Projeto Comprova, além de ser voluntária e monitora na Rádio e TV FAAP, atuando como produtora, roteirista e na parte de gravação. Foi repórter do LabJor FAAP e estagiária de comunicação na Secretaria Municipal de Relações Internacionais (SMRI), na IstoÉ Bem-Estar e Copywright e Gestora de Comunicação na Lemos Consultoria/Artis. Atualmente é Assistente de Comunicação da Fisesp.